Sapato baixo, calça larga e cabelo preso. Esquentou e seus ombros tensos agradecem. Que cara bonita é essa? Já logo no elevador. Ah, devo ter dormido bem. Bom dia, bom dia. Olha, você está muito bonita hoje. Um fala, outro concorda. E pelos corredores, sorrisos dão continuidade aos elogios. O que é? Que segredo ela guarda? Que novidade é essa? Na cozinha perguntam: novo amor? No estacionamento perguntam: voltou com alguém? No restaurante, na hora do almoço: é alguém novo? Cruza com um namorado antigo “nossa, você tá muito… é o quê? Sexo? A noite toda? Conta, vai, eu agüento ouvir”. Contar o quê? No espelho, enquanto escova os dentes, fecha os olhos e sabe pra si o segredo: ninguém. Não gostar de ninguém. Nada. Nem um restinho de nada. Nem de tudo que acabou e nem de nada que possa começar. Nada. Pouco importa qualquer outra vida do mundo. Não é nem pouco, é nada mesmo. Um dia inteiro para achar gostosas coisas bobas como um pacote de pipoca doce, um tênis pink ou a hora do banho quente com músicas recém baixadas e o tapetinho vermelho.”
             (Tati Bernardi)

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